3 de outubro de 2008

Síndrome de Hoffa e Sinal de Hoffa

A insidiosa instalação de dor na face anterior do joelho é frequentemente atribuída a entidades comuns, condromalácia patelar ou síndrome da dor femuropatelar. Uma ampla variedade de síndromes podem resultar em dor femoropatelar. Como em qualquer outro quadro clínico, se um plano de rotina de tratamento não é eficaz após um julgamento clínico razoável, uma expansão do diagnóstico diferencial deve ser feita. Um diagnóstico possível é a síndrome de Hoffa. Este tema será abordado a propósito da menção ao sinal de Hoffa, descrito abaixo. A síndrome de Hoffa é caracterizada pelo desenvolvimento de alterações inflamatórias crônicas associadas ao encerceramento da gordura infrapatelar hipertrofiada nos espaços fêmoro-tibial e fêmoro-patelar. O processo pode ter início após a ocorrência de um trauma maior agudo (direto ou indireto), ou de microtraumas repetitivos crônicos, causando hemorragia e edema na gordura infrapatelar. O aumento volumétrico resultante predispõe a aprisionamento e impacto sobre a gordura infrapatelar, acarretando acentuação das alterações inflamatórias locais, hipertrofia do coxim adiposo e retroalimentação do processo. O coxim gorduroso infrapatelar é comumente lesado, mas raramente discutido na literatura, sendo mais abordado por rediologistas. A evolução crônica da inflamação resulta em necrose dos adipócitos e proliferação fibroblástica, com acentuada fibrose. Eventualmente, pode ocorrer metaplasia condróide, e raramente ossificação endocondral, resultando no desenvolvimento de verdadeiros osteocondromas, como na figura apresentada acima (radiografia em perfil do joelho: massa calcificada na gordura infrapatelar, [foto: LOURENÇO; RODRIGUES, 2007]). Alterações mecânicas primárias, como genu recurvatum, microinstabilidade rotacional ou outras condições que reduzam os espaços fêmoro-tibial e fêmoro-patelar, contribuem para o processo e podem acarretar impacto primário, com evolução para encarceramento crônico de aspecto semelhante, sem um fator desencadeante traumático associado, sendo esta entidade caracterizada como síndrome de Hoffa (EMAD; RAGAB, 2006). Na literatura existem relatos e séries de casos de pacientes que se apresentam com história, sintomas, achados radiológicos e anatomopatológicos semelhantes aos descritos na doença de Hoffa, sendo apresentados como condromas "paraarticulares" ou "intracapsulares. Devido à similaridade entre os processos, alguns autores acreditam que ambas as entidades são relacionadas, sendo tais condromas, na verdade, mais do que simples áreas de transformação osteocartilaginosa ou ossificação heterotópica que se desenvolveram ao acaso na gordura infrapatelar, representando de fato o estágio final da síndrome de Hoffa (SADDIK et al., 2004). Clinicamente, os principais sintomas são dor na face anterior no joelho e redução da amplitude de movimento. Ao exame clínico caracteriza-se hipertrofia do tecido adiposo, que se apresenta endurecido e doloroso, sendo típico o achado do "sinal de Hoffa" (dor à extensão do joelho ao se aplicar compressão digital sobre a gordura infrapatelar). O diagnóstico radiográfico, baseado na identificação direta do osteocondroma, só é realizado tardiamente, após a ossificação. A ressonância magnética permite avaliar a presença de alterações inflamatórias tanto na fase aguda quanto na fase crônica. Emad e Ragab (2004) descrevem o seguinte caso clínico: Um homem de 37 anos, atleta, maratonista, desenvolveu dor anterior aguda do joelho após prolongada corrida, além de edema do seu joelho direito. O paciente apresentava mais dor quando flexionava o joelho e a impressão de que havia um derrame no joelho. Foi solicitada uma ressonância magnética do joelho direito, que revelou uma lesão hipodensa no coxim de gordura infrapatelar com mínimo derrame. Os achados de ressonância magnética indicaram o diagnóstico da síndrome de Hoffa, e foi realizada ressecção artroscópica do coxim de gordura. Houve uma melhora significativa nos sintomas e da função após a cirurgia.
Referências LOURENCO, R. B.; RODRIGUES, M. B. Qual é o seu diagnóstico? Radiol Bras, 40 (32008): 10-13, 2007. EMAD, Y.; RAGAB, Y. Liposynovitis prepatellaris in athletic runner (Hoffa's syndrome): case report and review of the literature. Clin Rheumatol, 26(7):1201-3, 2006 SADDIK, D.; McNALLY, E. G.; RICHARDSON, M. MRI of Hoffa's fat pad. Skeletal Radiol, 33(8):433-44, 2004