6 de maio de 2009

A comunicação não-verbal do paciente

Por Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde Estudante do sétimo período de Medicina da UFPB, extensionista do Projeto Continuum (PROBEX/UFPB)
A comunicação humana é uma área de investigação muito complexa. Ela é processada através de dois níveis: o verbal e o não-verbal.

A comunicação não-verbal é a forma não discursiva que pode ser transmitida através do corpo. A comunicação verbal exterioriza o ser social, e a não-verbal, o ser psicológico, sendo sua principal função a demonstração dos sentimentos. Pode-se acreditar então que a importância das palavras em uma interação entre pessoas é apenas indireta e que as relações interpessoais são mais influenciadas por canais de comunicação não-verbais do que verbais.
Fica, então, evidente, que na relação médico-paciente os sinais não-verbais são de capital importância, principalmente, na medida em que contribuem de forma relevante para melhor percepção da situação daquele que procura ajuda. Dentre todas as vertentes de comunicação não verbal, destacamos a Cinésica (linguagem do corpo), que descreve as posições e a movimentação do corpo humano, e que possui significado na comunicação interpessoal em diferentes culturas.
A análise cinésica incide sobre todas as partes do corpo, ressaltando-se que a expressão facial e é bastante utilizada para demonstrar sentimentos. Neste contexto, a Cinésica faz parte da Semiótica, que significa a doutrina dos signos verbais ou não, corpóreos, histórico-culturais, humanos e naturais. Logo, aplicada à associação entre Cinésica e Semiologia na prática médica, esta linguagem interessa à Semiótica médica. Pode-se exemplificar como decodificações da linguagem cinésica do paciente as seguintes dimensões: (a) Distância corporal: É ao mesmo tempo espelho e mecanismo de regulação da relação médico-doente. Numa relação de confiança mútua é mais fácil aproximar-se de um paciente ou tocar nele. Uma aproximação significa um sinal para intensificação da relação. O médico deve averiguar se o doente aceita a aproximação. ou se ela está de acordo com a situação. (b) Postura: Certas posições do corpo, como o cruzamento das pernas ou dos braços, podem significar resistência ou defesa. Se não identificar a sua causa, o médico perderá informações importantes e é menos provável que o doente siga os seus conselhos. (c) Mímica: Muitos doentes avaliam a atenção que o médico lhes dá pela sua expressão facial. Então o médico deve ter muito cuidado com a sua mímica, que deve ser adaptada às necessidades de comunicação com o paciente. Pode-se detectar na mímica do paciente o seu desespero e insegurança. (d) Contato visual: Através do contato visual o médico pode informar o doente que está seguindo atentamente as suas explanações. No entanto, em certas situações o doente pode não suportar o contato visual, devido à excessiva proximidade que ele exige. O médico deve estar atento às tentativas de contato visual do paciente e deve também respeitar os momentos em que ele não o deseja. A interpretação dos silêncios e pausas também tem muito valor. No doente, a mudança de tema é sempre reconhecida por uma pausa, que deve ser respeitada pelo médico, a menos que seja exageradamente prolongada. Há silêncios que traduzem embaraço ou vergonha. Há também o silêncio do desinteresse agressivo e ostensivo e o que resulta de obstáculos à intervenção.
O oposto, o não saber ouvir, é um problema sério na comunicação. Ouvir atentamente requer uma concentração intensa na expressão do doente em todas as suas manifestações e nuances, procurando ler o significado de qualquer gesto ou movimento. Do exposto acima, depreende-se que não se deve esquecer que a abertura de uma canal de comunicação repercute nos dois lados, podendo haver um fenômeno de “espelhamento”, onde o paciente é um espelho do que recebe do médico, ou até mesmo situações consideradas iatrogênicas, quebrando o raciocínio de que no contexto da assistência à saúde do outro, toda comunicação verbal e não-verbal deve ser benéfica, efetiva e, se possível, terapêutica.
Portanto, é necessário que o médico treine sua capacidade de percepção, uma vez que a rotina e os pequenos problemas do dia a dia fazem com que o mesmo “olhe sem ver, escute sem ouvir e toque sem sentir”.
Para finalizar, seguem dois exemplos de situações onde a linguagem cinésica pode ser iatrogênica:
(a) Uma aluna da área de saúde, que estava acompanhando um estágio e foi fazer um curativo de paciente idosa que fraturou a cabeça do fêmur e colocou uma prótese. O local da lesão estava bastante edemaciado e avermelhado. Ao levantar-se o lençol expondo a ferida operatória, a aluna olhou para a ferida e fez uma cara de espanto evidente, o que levou a senhora a dizer: “Mas o que está acontecendo? Por que você está olhando desse jeito?” Ficou evidente que esta ficou com medo da aluna e da sua situação, ficando extremamente nervosa. [...] O não-verbal da aluna “falou tudo”: o quão grave estava aquela cicatrização, que não estava “bonita”. (b) Uma auxiliar de enfermagem foi realizar higiene íntima em uma paciente acamada, mas consciente, que havia evacuado. A expressão da auxiliar estava péssima, de descontentamento, asco, causando grande constrangimento na paciente. Com isso, a paciente se inibiu para pedir ajuda para sua higiene íntima, proporcionando o aparecimento de úlceras de decúbito, além do evidente prejuízo psicológico, com a diminuição da sua auto-estima.
Referências RODRIGUES, J.G. Obstáculos à comunicação médico-paciente. In: Parte I – Relação, Comunicação e Consulta - Relação e comunicação médico-paciente e médico-família, MGF, 2000. Acesso: 05 mai 2009. ARAUJO, M.M.T.; SILVA, M.J.P.; PUGGINA, A.C.G. A comunicação não-verbal enquanto fator iatrogênico. Rev. esc. enferm. USP, São Paulo, 41 (3): 419-425, 2007 .
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Crédito da imagem: a figura desta postagem foi retirada de http://www.selfhelpdevelopment.com/html/site/neuro_linguistic_programming.htm