28 de junho de 2011

Publicar ou Perecer? Eis a Questão...

Por Priscilla Duarte Ferreira
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB

Resumo
A publicação é a via final e necessária de um trabalho científico, e confere tradição, possibilidade de captar recursos aos pesquisadores e instituições acadêmicas, além de revelar talentos na área científica. A publicação científica assume, nos tempos atuais, um papel pragmático, fornecendo conhecimento que subsidie novas tecnologias e aplicações práticas, gerando efeitos concretos em um determinado campo de ação humana. Contudo, o aforisma "publicar ou perecer", corrente em discussões no ambiente científico, diz respeito à necessidade e exigência acadêmica de publicar trabalhos desenvolvidos para que os investimentos e conhecimentos adquiridos na pesquisa não sejam desperdiçados. Tornou-se uma meta primordial nessa área a publicação de artigos científicos, que também são critérios empregados para avaliação da produção docente no ensino superior.

Palavras-Chave: Publicação, Artigo, Informação.

O aforisma original em inglês "publish or perish", traduzido como "publique ou pereça", diz respeito a uma das "palavras de ordem" em vigor no ambiente científico. Partindo-se do pressuposto de que um estudo com enfoque de um problema relevante para a sociedade deve levar, por meio de grupos e representantes, à sua utilização para a resolução de seus problemas e à agregação da contribuição ao corpo de conhecimentos existente [1].

A publicação científica encerra uma etapa de pesquisa o registro científico detalhado de todas as hipóteses, os experimentos, arquivamento dos dados e análises, e conclusões. Ela faz parte do acervo de inúmeras bibliotecas e centros científicos de todo o mundo, sendo facilmente disponível para a comunidade, podendo ser citado pelos seus pares em outros trabalhos posteriores.

Essa pode ser vista como forma de fornecer à comunidade técnico-científica o conhecimento de novas descobertas, o desenvolvimentos de novos materiais, técnicas e métodos de análises nas diversas áreas das ciências [2]. Uma de suas utilidades é também aumentar o prestígio dos autores, visto que pesquisador com numerosas publicações tem reconhecimento da comunidade científica, alcança melhores colocações e divulga o nome da instituição à qual está vinculado, obtendo também maiores recursos para esta.

Na sociedade atual, caracterizada pelo desenvolvimento de novas tecnologias, conhecimentos e informações, tem se formado uma cadeia que começa no sistema produtivo, onde são definidas as demandas, passando pelo financiamento da pesquisa e o desenvolvimento de produtos e processos, retornando ao primeiro sistema, na forma de inovações que possibilitam o aumento da competitividade dos países no mundo globalizado [2]. Países que não conseguem encadear o processo produtivo com a inovação tecnológica e produção de conhecimento, participam de um ciclo vicioso no qual a baixa produtividade econômica impede a realização de investimentos em educação e pesquisas cientificas e tecnológicas.

Publicada numa revista especializada, os resultados de pesquisas refletem a submissão do trabalho do pesquisador à comunidade científica, isto é, à revisão pelos seus pares, que terão a função de avaliar a publicação. Sendo assim, um trabalho publicado passou por um processo de revisão sério, por um crivo mínimo de excelência, segundo os critérios daquela revista em particular. Como corolário, todo trabalho que não foi publicado, pode ser considerado sob suspeita, ou na verdade, inacabado.

É importante reconhecer que os órgãos patrocinadores e gestores da pesquisa científica no Brasil, como o CNPq e a CAPES, têm investido fortemente em programas destinados à sua melhoria. Isto poderia favorecer uma maior visibilidade da ciência produzida no Brasil [4].  Porém, na academia brasileira, segundo Nicolelis - em entrevista publicada no Jornal "Estadão" e amplamente difundida na mídia eletrônica -, as recompensas dependem do que ele chama de "índice gravitacional de publicação": quanto mais volumoso o currículo, melhor. Ou seja, o cientista precisa "colecionar" o maior número de publicações, sem importar tanto seu conteúdo e qualidade.

Por outro lado, a chamada "produção científica" começa a se tornar rotineira gerando verdadeira explosão da informação. Um clichê sempre presente nas discussões sobre comunicação científica é "publicar ou perecer". Alguém já o corrigiu para "publicar (qualquer coisa) ou perecer" [3].

Há uma busca quase obsessiva por currículos nos quais o número de trabalhos publicados supera o que seria razoável durante a vida útil de um ser humano. Isso reflete a adoção de uma atitude em que os achados das investigações são apresentados de forma desnecessariamente fragmentada e, às vezes, prematura. Nesse sentido, a expressão inglesa salami publishing refere-se ao fato de que os autores fatiam suas pesquisas em muitas e magras partes, de modo que a cada uma delas corresponda um trabalho a ser publicado [3].

A ênfase em indicadores quantitativos, no que concerne à avaliação de desempenho, pode ser responsável pela publicação de trabalhos em forma duplicada, pelo regurgitamento de argumentos e citações, pelo engessamento das idéias em "referenciais" teóricos, de forma sectária e dogmática, pela feudalização dos grupos de pesquisa, cujos coordenadores/orientadores, muitas vezes, arrogam-se o papel de suseranos a reivindicar obediência ao costume (real ou mítico) do jus primae noctis. Assim, muitas vezes ocupam a primazia da autoria em trabalhos em que sua participação foi meramente circunstancial [3].

Vivemos um momento crucial em que talvez se esteja forjando um novo modelo, uma nova forma de socialização das informações. Mas a construção desse modelo passará inevitavelmente pela definição de um novo consenso sobre quando publicar e como publicar. Pilhas de palavras, gráficos e equações são produzidas apenas para aumentar a quantidade das coisas que irão, rapidamente, para o lixo da história, inflando por algum tempo o ego e a reputação local de alguns.

Nota-se, portanto, que essa alta produção torna-se irrelevante se não for acompanhada de sua divulgação com fidedignidade e qualidade, o que exige, como condição necessária, que os veículos de divulgação tenham características técnico-científicas mínimas, a fim de oferecerem as informações necessárias para uso no processo de desenvolvimento de qualquer país [4].

Por fim, é preciso alimentar o hábito institucional de discutir ciência, criando novos meios eletrônicos para divulgar os resultados da pesquisa, os quais muitas vezes ficam nas “gavetas”, perecendo. O movimento em prol do acesso livre à informação é extremamente bem-vindo e merece o apoio de todos os profissionais da informação e da comunidade que realiza pesquisas em todas as áreas.

Referências
[1] ANDRADE, I. B.; LIMA, M. C. . Manual de Elaboração de Apresentação de Trabalhos Científicos. Fundação Benedito Pereira Nunes. Faculdade de Medicina de Campos. 2007. Disponível em: http://www.biblioteca.fmc.br/Monografia/artigo_cientifico.pdf. Acesso em: 28 jun. 2011.
[2] PEREIRA JÚNIOR, A. A Publicação Científica na Atualidade. Sociedade Brasileira de Angiologia Vascular. J Vasc Bras, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/jvb/v6n4/v6n4a02.pdf. Acesso em: 28 jun. 2010.
[3] LEMOS, A. A. B. Publicar e perecer. Ci. Inf., Brasília, v. 34, n. 2, 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-19652005000200001&lng=en&nrm=iso.  Acesso em: 28 jun. 2011.
[4] CABRAL-FILHO, J. E. Revistas científicas brasileiras: publicar e perecer? Rev. Bras. Saude Mater. Infant., Recife, v. 8, n. 4, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-38292008000400001&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 28 jun. 2011.