28 de agosto de 2010

Delírios, Delirium e Alucinações

Stephanie Galiza Dantas
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

Delírios e alucinações são sintomas característicos dos transtornos psicóticos, a exemplo da esquizofrenia. Quando a alteração de juízo é decorrente de um distúrbio da consciência, chama-se delirium. Este último não é uma doença psiquiátrica primária, é uma síndrome que cursa com vários sinais e sintomas neuropsiquiátricos e que decorre de uma perturbação neurológica de causa orgânica. Frequentes e com expressiva relevância sobre a morbimortalidade, tanto os delírios e alucinações (sintomas psicóticos), quanto o delirium (síndrome neuropsiquiátrica) são manifestações importantes da Semiologia Psiquiátrica.
Palavras-chave: Alucinações. Delírios. Sinais e Sintomas.

Delírios e alucinações são sintomas frequentes dos transtornos psicóticos. A psicose pode ser definida como uma condição em que ocorre o distanciamento da realidade e um comprometimento do estado mental, com a formulação de conclusões incorretas sobre a realidade externa, mesmo diante de evidências contrárias (SOUZA et al., 2004).
Nesse tipo de transtorno mental, o paciente passa a acreditar que seus pensamentos e fantasias são acontecimentos reais. As alterações mais características da síndrome psicótica são as alucinações e os delírios, que estão incluídos nos sintomas positivos, ou produtivos, dos surtos psicóticos da esquizofrenia, doença crônica em que há a presença de sintomas psicóticos que causam prejuízo das funções psíquicas, sobretudo pensamentos, emoções e comportamento. As alucinações podem ser inseridas no âmbito das experiências anômalas, que são vivências incomuns ou que se acredita diferentes do habitual e das explicações usualmente aceitas como realidade. Juntamente com os estados alterados de consciência, que incluem a demência, ambos são descritos em todas as civilizações de todas as eras, constituindo-se elementos importantes na história das sociedades. Não obstante, têm recebido pouca atenção da comunidade científica, ou são abordados de forma pouco rigorosa (ALMEIDA; NETO, 2003). Alucinações representam a vivência da percepção de um objeto, de forma clara e definida (voz, ruído, imagem), sem o estímulo sensorial respectivo, isto é, sem a presença real do objeto. Dessa forma, o paciente entende a alucinação como uma experiência sensorial normal. Há diversos tipos de alucinação, incluindo alucinações auditivas (desde palavras simples ou sons não-estruturados, designadas alucinações elementares, até vozes acusatórias, de comando, denominadas alucinações audioverbais, podendo também ser musicais) e visuais (o paciente afirma ver imagens nítidas).
É importante salientar a diferença entre os termos delírio e delirium. O primeiro é um sintoma observado principalmente nas esquizofrenias e o segundo consiste em alteração do juízo de realidade (capacidade de distinguir o falso do verdadeiro) e implica em lucidez da consciência. Por outro lado, o delirium tem como característica fundamental uma perturbação da consciência, acompanhada por uma alteração na cognição, que não pode ser melhor explicada por uma demência preexistente, ou em evolução. No delirium, os distúrbios cognitivos são predominantemente do nível de consciência, o que se diferencia, por exemplo das esquizofrenias, em que há alteração isolada de conteúdo (CHENIAUX, 2005).
Vazquez et al. (2000), estudando uma coorte de idosos internados, concluíram que o delírio é frequente neste grupo e que os pacientes com delírio apresentaram internações mais prolongadas, maior risco de migração para centros terciários e maior mortalidade. Logo, o delírio tem impacto negativo na utilização dos recursos, bem como na mortalidade.
A compreensão dos delírios também é fundamental no campo da psiquiatria infanto-juvenil. Nesta faixa etária, habitualmente ocorre o início súbito de alterações da consciência, da memória, da linguagem e/ou idéias delirantes durante o curso de uma doença, pelo uso de substâncias ou no pós-operatório (VENTURA; INZUNZA, 2008). Os sintomas da síndrome psicótica podem advir de um transtorno orgânico ou psiquiátrico. O transtorno mental orgânico (TMO) corresponde a manifestações psiquiátricas decorrentes de afecções somáticas, podendo ser causado por várias condições médicas, incluindo epilepsia, neoplasias, endocrinopatias, infecções do sistema nervoso central e sistêmicas, abstinência a drogas, traumatismos, doenças degenerativas cerebrais (exemplo: Doença de Alzheimer, Doença de Parkinson), hipóxia, efeitos colaterais de medicamentos, distúrbios hidroeletrolíticos e doenças cerebrovasculares (exemplo: acidente vascular encefálico).

Os quadros agudos são denominados delirium, e os crônicos, demência. Podem afetar pessoas de qualquer faixa etária e apresentam as mais diversas manifestações psicopatológicas, acompanhadas ou não de achados ao exame físico, exames laboratoriais e de imagem. O delirium é uma síndrome de início súbito caracterizada por alterações da consciência. O indivíduo passa a variar o nível de consciência, com momentos de melhora e piora. Nem sempre as alterações são facilmente reconhecidas, visto que, por serem fugazes, o indivíduo pode aparentar normalidade em certas ocasiões, quando está em um estado denominada obnubilado. Por isso, torna-se fundamental avaliar as demais funções psíquicas, sobretudo orientação e memória.
É importante ressaltar que pode haver sobreposição de um quadro demencial a um delirium, como em um paciente com Alzheimer que adquiriu uma infecção, passando a apresentar alterações metabólicas sistêmicas e alteração do nível de consciência. No contexto do TMO, alucinações musicais podem estar associadas a déficits auditivos e doenças neurológicas em idosos; epilepsia, delirium e intoxicação por drogas alucinógenas causam sintomas visuais. O delirium tremens, por abstinência do álcool, pode apresentar a denominada alucinação induzida: o examinador, na frente do paciente, segura um fio imaginário e pergunta se ele pode vê-lo, e o mesmo, além de segurá-lo, consegue até mesmo dar um nó.
Alucinações táteis ocorrem na intoxicação por cocaína e abstinência de álcool, e olfativas, por epilepsia parcial complexa. Alucinações auditivas podem decorrer de alcoolismo crônico e as visuais, de déficits visuais, tumores de tronco cerebral e intoxicação por alucinógenos.
As alucinações de pacientes com epilepsia de lobo temporal costumam ser de conteúdo repetitivo, estereotipado, associada a alterações da consciência, enquanto as decorrentes de privação sensorial costumam ser de conteúdo variável, com duração de horas, além de diminuir com estímulos ambientais (Ibid). Por sua vez, delírios de grandeza podem ocorrer na paralisia geral progressiva, uma forma de comprometimento cerebral da sífilis. O delírio de ciúme ocorre em alcoolistas crônicos. Os delírios de infestação podem ocorrer no delirium tremens e na intoxicação por cocaína ou alucinógenos, enquanto o delírio ocupacional ocorre no delirium tremens, associado à alteração da consciência. O delírio fixo, inabalável e plausível é a manifestação primária do transtorno delirante, que acomete cerca de 0,03% da população (SOUZA et al., 2004), sobretudo homens de meia idade.
Os principais tipos de delírio nos transtornos mentais são: 
- Delírio erotomaníaco: delírio de ser intensamente amado por outra pessoa, geralmente famosa ou de maior posição social ou hierárquica; 
- Delírio grandioso: delírio de ter talentos não reconhecidos ou de ter feito uma grande descoberta ou mesmo crenças fixas de poder (ex. ser proprietário de uma empresa bem-sucedida); - Delírio de ciúmes: por vezes difícil de diferenciar de receios e experiências reais; e
 - Delírio persecutório: corresponde ao tipo mais comum - delírio de ser perseguido, de ser vítima de conspirações ou ameaças. 
Alucinações e delírios também podem estar presentes em outras condições, como o transtorno esquizofreniforme (sintomas semelhantes à esquizofrenia, porém com duração de no mínimo um mês e no máximo seis meses), o transtorno psicótico breve (sintomas psicóticos por mais de um dia e menos de um mês, com bom funcionamento pré-mórbido e retorno ao padrão anterior ao final do episódio), o transtorno esquizoafetivo (episódio depressivo maior com os sintomas de esquizofrenia, podendo ser classificado em depressivo e bipolar) e transtornos de humor (depressão e mania).
O delírio persecutório é comum na depressão e difere da esquizofrenia por não ser bizarro e estar vinculado ao tema da morte ou de perdas significativas, Vivências deliróides podem ocorrer em estados mais graves de depressão, em que o paciente pensa que seu corpo está parado, sem funcionar. Na mania, é comumente encontrado o delírio de grandeza.

Referências 
ALMEIDA, M.A.; NETO, F.L. Diretrizes metodológicas para investigar estados alterados de consciência e experiências anômalas. Rev. psiquiatr. clín. 30(1), 2003.
CHENIAUX, E. Psicopatologia descritiva: existe uma linguagem comum?. Rev. Bras. Psiquiatr., 27 (2): 157-162, 2005. SOUZA, J.C. et al. Psicopatologia e psiquiatria básicas. São Paulo: Vetor, 2004. VAZQUEZ, F. et al. Epidemiologia del delirio en ancianos hospitalizados. Medicina (Buenos Aires). 60(5): 555-560, 2000. VENTURA, T.; INZUNZA, C. Delirium em niños y adolescentes. Pediatr. día. 24(4): 32-37, 2008. RUIZ, R.H.; RUIZ, A.P. Estructura ideal de los delirios. Acta psiquiátr. psicol. Am. Lat. 42(1): 32-42, 1996.

Imagem: "O Grito" (no original "Skrik"), famosa pintura do artista norueguês Edvard Munch (1893).

23 de agosto de 2010

Medicina Através da História: Revisando a aula 3 de MHB3


Medicina na Idade Média(1) Houve aspectos positivos na Medicina ligados à Religião na Idade Média? Se resposta afirmativa, quais?
(2) Houve aspectos negativos na Medicina ligados à Religião na Idade Média? Se resposta afirmativa, quais?
(3) Comente aspectos relacionados à Saúde Pública na Idade Média.
(4) Quais os impactos das guerras medievais sobre a Medicina?
(5) Que impacto teve a queda de Roma sobre a Medicina?
(6) Quais foram as crenças médicas durante a Idade Média?
(7) Comente os três grandes períodos da medicina medieval: monástico, árabe e escolástico.
(8) Quando ocorreu o início da institucionalização do ensino médico no medievo?
(9) O termo “Idade das Trevas” oferece um julgamento justo em relação ao período medieval no que concerne à Medicina? Justifique.
(10) Comente a repercussão social e demográfica da maior epidemia da Idade Média.
(11) Analise as palavras de um médico medieval: "Como autodefesa não havia nada melhor que fugir da região antes que ficasse infectada e tomar purgativos de pílulas de aloés, diminuir o sangue pela flebotomia e purificar o ar pelo fogo, reconfortar o coração com o sene e coisas perfumadas e abrandar os humores com terra da Armênia e resistir à putrefação por meio de coisas ácidas. " (Guy de Chauliac, médico, 1300-1368).
(12) Como surgiram os cirurgiões-barbeiros e qual o seu papel na Medicina?
(13) Qual o status social do cirurgião em relação ao médico clínico na Idade Média?
(14) Você concorda que a Medicina é "um conjunto de verdades provisórias"? Justifique.
(15) Por que se usavam sangrias na Idade Média?
(16) Comente a seguinte frase latina "Clysterium donare, postoe seignare, ensuita purgare”, comum na época medieval (tradução: Dar clister, depois sangrar, em seguida purgar).
(17) Como foram considerados os ensinamentos hipocráticos na Idade Média?
(18) Como eram realizadas as cirurgias na Idade Média?
(19) Qual o pensamento e a contribuição de São Tomás de Aquino?
(20) Como eram encarados os pacientes portadores de Hanseníase na Idade Média? Compare aquela situação com a atual nos aspectos terapêuticos e sociais.

Medicina e Renascimento (1) A Renascença representou o fim da ignorância e das trevas na Medicina?
(2) “Um grande número de contradições caracterizou a Renascença na Medicina”. Você concorda com esta afirmação? Justifique.
(3) Qual o impacto da obra de Leonardo da Vinci sobre o desenvolvimento da Anatomia?
(4) Quais as principais características da Medicina Renascentista?
(5) Qual a principal contribuição de Andréas Vesalius à Medicina?
(6) Como surgiu a Sífilis durante a época do Renascimento na Europa?
(7) Qual a influência do pensamento de René Descartes e de Isaac Newton sobre a Medicina?
(8) Qual foi a contribuição de Paracelsus à Medicina?
(9) Que médico fez o primeiro desenho do preservativo masculino e qual o seu objetivo?
(10) O que é "alquimia" e qual a sua relação com o desenvolvimento da Medicina?

Imagem acima: Obra de arte que retrata uma aula de anatomia ("Lição de Anatomia do Dr. Nicolaes Tulp"), concluída em 1632 pelo pintor holandês Rembrandt Harmenszoon van Rijn.

20 de agosto de 2010

Seminário "Síndromes Respiratórias" em 2010.2


Coordenação: Profa. Rilva Sousa-Muñoz
Data: 10/09/2010, às 7h00.
Turma: 2 (manhã)
Local: Sala 1 do 5o. andar do HULW

(1) Apresentação do seminário
A atividade terá a dinâmica de uma discussão em grupo, a despeito do termo acima, "seminário". Todos estudarão o conteúdo completo programado para a discussão. Nesta, cada aluno será convidado a comentar o que leu sobre três dos aspectos listados abaixo (item 2) em relação a uma das síndromes respiratórias do item 3 do presente roteiro (exceto sub-item 3.11, em que se abordarão apenas mecanismos fisiopatológicos e causas).

(2) Aspectos a serem explorados em relação a cada síndrome
a) Definição; b) Causas; c) Sintomas; d) Fisiopatologia da síndrome e dos sintomas; e) Anormalidades do exame físico geral (se houver sinais característicos); f) Anormalidades do exame do tórax (considerando as etapas de inspeção, palpação, percussão e ausculta)
(3) Roteiro das síndromes respiratórias para o seminário
3.1- Síndrome de consolidação pulmonar;
3.2- Síndrome de atelectasia;
3.3- Síndrome pulmonar cavitária;
3.4- Síndromes de supuração broncopulmonar (bronquiectasia e abscesso pulmonar);
3.5- Síndromes de obstrução de via aérea superior;
3.6- Síndrome de obstrução brônquica difusa (asmática);
3.7- Síndrome de limitação crônica ao fluxo aéreo: DPOC tipo A (PP), tipo B (BB), complexo bronquite-enfisema.
3.8- Síndromes pleurais: inflamatória (pleuris seco) e paquipleuris
3.9- Síndrome de derrame pleural;
3.10- Síndrome de pneumotórax;
3.11- Insuficiência respiratória (mecanismos fisiopatológicos e causas).


(4) Sugestões bibliográficas
(a) Livros de Semiologia Médica
4.1- LOPEZ, M.; LAURENTIS, J. Semiologia Médica: As bases do diagnóstico clínico. Rio de Janeiro: Revinter, 2004, 5a. Ed. Cap. 35.
4.2- RAMOS JÚNIOR, J. Semiotécnica da Observação Clínica: Fisiopatologia dos sinais e sintomas. Rio de Janeiro: Ed. Sarvier, 1986, 7a. Ed., p. 370-389.
4.3- BICKLEY, L. S.; HOEKELMAN RA. Bates: Propedêutica médica. 8a. Ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 2005, p. 234-235.
4.4- PORTO, C. C. Exame Clínico: Bases para a prática médica. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2008, 6a. Ed., p.298-307 [“Portinho”]

4.5- SEIDEL, H. M. Mosby: Guia de Exame Físico. 6ª Ed. São Paulo: Elsevier, 2007, p. 399-413.
(b) Bibliografia complementar
4.6- GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de Fisiologia Médica. São Paulo: Elsevier, 2006. Unidade VII.
4.7- SILVEIRA, I. C. O Pulmão na Prática Médica. Rio de Janeiro: Ed. Publicações Médicas, 1983, Cap. 2, p. 33.

16 de agosto de 2010

Medicina Através da História: Revisando a Aula 2 de MHB3

Questionamentos para uma retrospectiva da Aula 2 de MHB3 em 2010.2
(1) Como se deu a transformação da visão sobre a doença e a cura ao longo da Antiguidade? (2) Quais as crenças religiosas do Antigo Egito e que impacto tiveram sobre a evolução da Medicina? (3) Comente a afirmação: "Os filósofos gregos contribuíram para a racionalização da Medicina". (4) Explique a Teoria dos Quatro Humores. (4) Qual foi a primeira civilização antiga que deixou escritos seus conhecimentos médicos? Explique. (6) Como funcionavam os Asclepiones? (7) Qual a origem da palavra "histeria" e como este quadro foi interpretado nos primórdios da Medicina? (8) Comente os principais preceitos da Medicina Hipocrática. (9) Qual foi o impacto da Medicina Hipocrática sobre a observação clínica? (10) Em que sentido a Medicina mudou durante a Antiguidade, desde a época arcaica até a clássica? (11) Que império da Antiguidade contribuiu significativamente para a saúde pública? Explique. (12) Por que os médicos de Roma eram gregos na Antiguidade Clássica? (13) Quais foram as contribuições de Galeno à Medicina? (14) Comente os equívocos de Galeno nos conhecimentos sobre anatomia e fisiologia. (15) Que confusão ainda existe na atualidade sobre o símbolo da Medicina? Comente. Figura da postagem: Culto ao deus grego da Medicina, Asclépio, em um templo de cura na Antiga Grécia. São vistos os doentes em tratamento, o sacerdote, o deus Asclépio e os ex-votos fixados na parede do templo.

13 de agosto de 2010

Semiologia dos Transtornos Alimentares

Por Stephanie Galiza Dantas
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB

Resumo

Os transtornos alimentares são condições frequentes na prática médica, tornando-se essencial diagnosticá-los adequadamente, em virtude de sua elevada prevalência e morbidade. Os transtornos podem ter início na infância ou na adolescência, sendo estes mais comuns e classificados como anorexia e bulimia nervosas. Os sinais e sintomas decorrem basicamente de complicações advindas dos hábitos alimentares e de distúrbios hidroeletrolíticos, como emagrecimento progressivo, amenorréia, hipotensão, hipocalemia, hipoglicemia e anemia.

Palavras-chave: Transtornos alimentares. Diagnóstico. Sinais e Sintomas. Os transtornos alimentares são doenças psiquiátricas caracterizadas por graves alterações do comportamento alimentar e que afetam sobretudo adolescentes e adultos jovens do sexo feminino.
Aqueles transtornos que se iniciam na primeira infância são classificados em transtorno da alimentação da primeira infância (perda ponderal ou falha em ganhar peso adequadamente, com início antes dos seis anos), pica (ingestão de substâncias não nutritivas, como terra, cabelo e barro) e transtorno de ruminação (episódios repetidos de regurgitação não explicados por nenhuma condição médica).
Por outro lado, os que têm início na adolescência são designados transtornos de alimentação propriamente ditos, a saber: bulimia nervosa (BN) e anorexia nervosa (AN). Ademais, existem as síndromes parciais de AN e BN e o transtorno de compulsão alimentar periódica (episódios de compulsão alimentar, mas sem o uso de medidas extremas para evitar o ganho de peso). A AN e a BN são patologias intimamente relacionadas e apresentam uma série de sintomas em comum: preocupação excessiva com o peso, distorção da imagem corporal e medo patológico de engordar. O perfil dos pacientes corresponde a adolescentes do sexo feminino, raça branca e alto nível socioeconômico e cultural. No entanto, tem-se observado o acometimento de um grupo cada vez mais heterogêneo. Em conformidade com Philippi et al. (2004), os fatores de predisposição para o desenvolvimento dos transtornos alimentares incluem: sexo feminino, história familiar, baixa auto-estima, perfeccionismo e dificuldade em expressar emoções.
Quanto aos fatores precipitantes são mencionados: dieta, separação e perda, alterações na dinâmica familiar, expectativas irreais e proximidade da menarca. No que tange aos fatores mantenedores dos transtornos são referidas alterações endócrinas, alterações da imagem corporal, distorções cognitivas e práticas purgativas. Determinadas comorbidades psiquiátricas estão comumente associadas aos transtornos alimentares, incluindo abuso e dependência de drogas e álcool, síndromes depressivas, transtornos ansiosos, como fobia social e transtorno obsessivo compulsivo, além de transtornos de personalidade. - Anorexia nervosa (AN) A AN consiste na abstenção voluntária de alimentos, resultando em um quadro de inanição deliberada e auto-imposta. Este quadro está associado a distúrbios no ciclo menstrual e alteração da imagem corporal. Relata-se uma prevalência de 0,28% em mulheres jovens, com picos de incidência entre 14 e 17 anos (YAGER at al., 2000).
Na AN ocorre restrição alimentar progressiva, com redução do número de refeições até atingir o jejum. O paciente passa a viver exclusivamente em função da dieta, do peso e da forma corporal, com perda de peso acentuada e progressiva. O medo de engordar é uma característica fundamental na AN, o que a distingue de outras formas de anorexia secundárias a doenças clínicas ou psiquiátricas. Segundo a Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-IV), há duas apresentações clínicas: AN restritiva (apenas restrição dietética) e AN purgativa (episódios de compulsão alimentar seguidos de métodos compensatórios, como vômitos auto-induzidos, uso de laxantes, diuréticos e/ou prática de exercícios extenuantes). Os sintomas habitualmente apresentados pelo paciente são intolerância ao frio, fadiga, irritabilidade, queda de cabelos, unhas quebradiças, constipação, dor abdominal, anorexia, alterações do esmalte dentário, letargia, extremidades frias, infertilidade, amenorréia e dificuldade de concentração.
Os achados clássicos ao exame físico estão relacionados à desnutrição e à disfunção hipotalâmica e incluem pele seca, hipotermia, bradicardia, hipotensão, bradipnéia e edema de extremidades. A gravidade da desnutrição pode ser estimada através do índice de massa corpórea.
Pode-se observar palidez cutânea, pele seca, sem brilho e, algumas vezes com fina camada de pêlos (lanugo). Este último pode decorrer de uma redução da atividade da enzima 5-alfa redutase e/ou do estado de hipotiroidismo. Pode ser ainda observada uma coloração amarelada da pele, decorrente dos níveis elevados de caroteno (ASSUMPÇÃO; CABRAL, 2002). Úlceras ou escarificações dorsais da superfície das mãos e a presença de calos nos dedos podem ser observados em decorrência dos vômitos excessivos. Este achado recebeu o nome de "Sinal de Russel" e ocorre como resultado de traumatismo da pele, secundário ao uso das mãos como instrumento indutor dos vômitos (Ibid). - Bulimia Nervosa (BN) É um transtorno característico das mulheres jovens e adolescentes, com prevalência de 1,1% a 4,2% neste grupo (YAGER at al., 2000), com média de idade de início aos 20 anos.
O episódio de compulsão alimentar, geralmente no decorrer de uma dieta, consiste no principal sintoma. Embora no início possa estar relacionado à fome, após a instalação do ciclo compulsão alimentar-purgação tende a ocorrer em qualquer situação que gere sentimentos negativos.
Wallin et al. (1994) relataram que a seleção alimentar durante os episódios segue um padrão semelhante, como pães, bolos, massas, sanduíches, chocolates, pizzas e doces. O vômito auto-induzido é o principal método compensatório utilizado, com freqüência variável (um até dez ou mais episódios por dia), ocasionando o alívio do desconforto físico pela hiperalimentação e, sobretudo, atenuando o medo de ganhar peso.
Outros mecanismos usados são laxativos, diuréticos, hormônios tireoidianos, agentes anorexígenos e enemas, além da negligência do tratamento insulínico em diabéticos, sendo esta última uma apresentação especial descrita pela Classificação Internacional de Doenças (CID-10). De acordo com o DSM-IV, há duas formas de BN, o tipo purgativo (uso de métodos compensatórios mais invasivos: vômitos, laxantes, etc.) e o tipo não-purgativo (apenas dieta, jejuns e exercícios). O quadro clínico pode evidenciar complicações da BN, como sinais de desidratação, dor abdominal, constipação, hipertrofia das parótidas, erosão do esmalte dentário e cáries, podendo, em casos mais graves, ocorrer perfuração esofágica e ruptura gástrica.

Outras complicações clínicas relacionadas à AN são decorrentes da própria desnutrição, enquanto na BN os distúrbios hidroeletrolíticos são mais frequentes, como hipocalemia, hipocloremia, hiponatremia, hipoglicemia, alcalose metabólica e desidratação. Ressalta-se que na anorexia do tipo bulímico o peso do paciente, a rigor, está abaixo do desejado, enquanto na bulimia está normal ou acima.

Outros aspectos que podem auxiliar no diagnóstico diferencial com AN incluem maior incidência de BN nas fases tardias da adolescência, referência de fome, paciente mais extrovertido, comportamento alimentar como motivo de vergonha e culpa, vida sexual mais ativa. Diferentemente da AN, o paciente bulímico não tem desejo de emagrecer cada vez mais e, não obstante a possibilidade de ocorrer irregularidade menstrual, a amenorréia é característica da AN. - Diagnóstico O diagnostico dos transtornos alimentares é eminentemente clínico. No entanto, alguns exames laboratoriais podem ser úteis na identificação de complicações, xomo hemograma (anemia), lipidograma (dislipidemia), glicemia (hipoglicemia e exclusão de diabetes), albumina (hipoalbuminemia), eletrólitos, zinco, estudo do ferro (anemias ferroprivas), função renal e hepática, eletrocardiograma (bradicardia sinusal, arritmia sinusal ou ventricular), densitometria óssea (osteopenia e osteoporose). Por fim, como salientam Borges et al. (2006), antes da definição do diagnóstico de AN ou BN é essencial excluir causas orgânicas que podem simular os quadros de transtornos alimentares, como doenças gastrointestinais e comsumptivas (Aids), depressão e esquizofrenia, síndrome da artéria mesentérica superior (Diferencial para AN) e transtornos da personalidade, AN do tipo compulsivo ou purgativo e depresão com características atípicas (BN). Referências
ASSUMPCAO, C. L.; CABRAL, M. D. Complicações clínicas da anorexia nervosa e bulimia nervosa. Rev. Bras. Psiquiatr. 24 (suppl.3): 29-33, 2002. BORGES, N. J. B. G. et al. Transtornos alimentares: Quadro clínico. Medicina (Ribeirão Preto). 39 (3): 340-348, 2006. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Classificação dos transtornos mentais e do comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993. PHILIPPI, S.T.; ALVARENGA, M. Transtornos alimentares: uma visão nutricional. In: Cordás T. A.; Salzano, F. T.; Rios S. R. Os transtornos alimentares e a evolução no diagnóstico e no tratamento. Barueri: Manole, 2004. WALLIN, G. et al. Binge eating versus nonpurged eating in bulimics: is there a carbohydrate craving after all?. Acta Psychiatr Scand, 89: 376-81, 1994. YAGER, J.; ANDERSEN, A.; DEVLIN, M.; EGGER, H.; HERZOG, D.; MITCHEL, J. et al. Pratice guideline for the treatment of patients with eating disorders. In: American Psychiatric Association pratice guidelines for treatment of psychiatric disorders: Compendium 2000. Washington (DC): American Psychiatric Association, 2000.
Crédito da figura da postagem: http://www.piyadehukuk.com

11 de agosto de 2010

Seminários de MCO3 em 2010.2: Cronograma da Turma 1

No semestre letivo de 2010.2 serão realizados cinco seminários entre 27/10/10 e 24/11/10 no Módulo de Elaboração de Trabalho Científico e TCC (MCO3).
Os alunos designados para cada seminário apresentarão o trabalho preparado previamente, tendo como objeto um projeto de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Os alunos devem se preparar também para responder aos questionamentos e comentários dos colegas, ao final da apresentação.
Os questionamentos devem versar sobre a apresentação do projeto e a metodologia científica e estatística empregada pelos autores. A apresentação do projeto terá duração de 20 minutos, e a discussão com a turma, 1h30. A ordem de apresentação dos cinco seminários (três grupos de cinco alunos e dois de quatro) da turma 1 foi determinada por sorteio hoje na abertura do módulo, conforme sequência abaixo:
27/10/2010: Seminário 1 - Guilherme, Nilton, Francieudo e Ramon;
03/11/2010: Seminário 2 - Ícaro, Jessé, Luiz Ferreira, Thiago Sá;
10/11/2010: Seminário 3 - Andrezza, Natália, Mariana, Juliete, Heloísa;
17/11/2010: Seminário 4 - Gabriella, Dayse, Laryssa, Liana, Álvaro;
24/11/2010: Seminário 5 - Pablo, Ygor, Felipe Oliveira, João Guilherme, Luiz Henrique.

9 de agosto de 2010

Seminários do MHB3 em 2010.2: Cronograma

06/09/10 - Seminário 1 - As Grandes Pestes
Apresentação: Lucas Emmanuel, Rayan, Thiago Carolino, Nathana, Priscylla e Isabela.
Coordenação: Profa. Rilva 13/09/10 - Seminário 2 - Miasmas ou Microorganismos?
Apresentação: Artur, Carlos Henrique, Lucas Neves, Gustavo, Wagner, Larissa, Gabriela.
Coordenação: Profa. Rilva 20/09/10 - Seminário 3 - História da Medicina no Brasil
Apresentação: Ana Carolina, Marina Domingues, Raiza, Débora, Rebeca, Jucélio.
Coordenação: Prof. Josias 27/09/10 - Seminário 4 - O Desenvolvimento da Teoria Microbiana das Doenças
Apresentação: Rachel, Maria José, Olga, Carlos Franklin, Teógenes, Vanessa Emanuelle
Coordenação: Profa.Rilva 04/10/10 - Seminário 5 - História da Medicina no Século XX
Apresentação: Higor, Camila, Dandara, Antônio, Aíla, Márcia.
Coordenação: Profa. Rilva 11/10/10 - Seminário 6 - História da Cirurgia
Apresentação: Amanda, Liana, Taynah, Lunna, Luana, Aline, Patrícia
Coordenação: Prof. Josias 18/10/10 - Seminário 7 - Melancolia: A Depressão no Contexto Histórico
Apresentação: Thiago Santos, George, Ítalo, Pedro Romão, Daniel, Josué.
Coordenação: Profa. Rilva 25/10/10 - Seminário 8 - História da Bioética
Apresentação: Vanessa Rodrigues, Lívia, Germana, João Luiz, Blentein, Alexandre
Coordenação: Profa. Rilva 08/11/10 - Seminário 9 - História da Oncologia
Apresentação: Pedro Moura, Marina Jales, José Antônio, Hellen, Diego, Victor Hugo
Coordenação: Prof. Josias
Figura desta postagem: "O médico Japyx cura Enéias" - Antigo afresco romano da "Casa do Cirurgião" em Pompéia, Itália; século I (Museu Nacional Arqueológico de Nápoles). O afresco reproduz episódio da Eneida, de Virgílio. Disponível em: http://www.history.org.uk/

7 de agosto de 2010

Pé em Risco

Por Rafael Lucas Costa de Carvalho
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

O portador de diabetes melito tem uma sobrevida maior a cada dia, convivendo com complicações crônicas da doença. O pé diabético é um importante problema de saúde pública, sendo a maior causa de internação nestes pacientes e de amputações, com redução importante da qualidade de vida. É necessária a realização de avaliação sistemática do pé do paciente diabético nos vários níveis de atenção à saúde. O Consenso Internacional sobre Pé diabético preconiza o rastreamento do pé em risco com o diapasão para avaliar a sensibilidade vibratória, monofilamento de Simmes-Weinstein e chumaço de algodão para a sensibilidade tátil e tubos de ensaio com substâncias frias e mornas para sensibilidade térmica, assim como objetos pontiagudos para sensibilidade dolorosa.

Palavras-chave: Diabetes melito. Pé diabético. Lesões podais. Com o avanço da abordagem geral do indivíduo portador de diabetes melito (DM), houve aumento da sobrevida do portador da doença e, com isso, as complicações passaram a ser constatadas com maior frequência, destacando-se, entre outras, as lesões nos pés, que podem levar a algum tipo de amputação de membro inferior.
A despeito de todo o avanço tecnológico na medicina, as taxas de amputação em membros inferiores em pacientes portadores de DM têm sido elevadas, o que deve levar a refletir sobre o assunto e, consequentemente, buscar novas formas de atuação (LOPES, 2003). O chamado "Pé Diabético" constitui uma complicação crônica de etiologia frequentemente multifatorial, com comprometimento vascular, neural articular e infeccioso (BRASILEIRO et al., 2005). Segundo o grupo de trabalho internacional sobre o problema (2001), a síndrome do pé diabético é a presença de qualquer infecção, ulceração e/ou destruição dos tecidos profundos associadas a anormalidades neurológicas e vários graus de doença vascular periférica nos membros inferiores. Lopes (2005) mostra que a lesão no pé do paciente portador de DM resulta da presença de dois ou mais fatores de risco associados. Na maioria dos pacientes portadores de DM, a neuropatia periférica tem um papel central: mais de 50% dos pacientes diabéticos tipo 2 apresenta neuropatia e pés em risco. A neuropatia leva a uma insensibilidade (perda da sensação protetora) e, subsequentemente, à deformidade do pé, com possibilidade de uma marcha anormal.
A neuropatia torna o paciente vulnerável a pequenos traumas (motivados, por exemplo, pelo uso de sapatos inadequados ou lesões da pele ao caminhar descalço), que podem precipitar uma úlcera. A deformidade do pé e a mobilidade articular limitada podem resultar em carga biomecânica anormal do pé, com formação de hiperqueratose (calo), que culmina com alteração da integridade da pele (úlcera). Com a ausência de dor, o paciente continua caminhando, o que prejudica a cicatrização. A doença vascular periférica, resultante da lesão endotelial por hiperglicemia, associada a pequeno trauma pode resultar em dor e úlcera puramente isquêmicas. Entretanto, deve ser lembrado que, em pacientes com isquemia e neuropatia (úlcera neuro-isquêmica), os sintomas podem estar ausentes apesar de isquemia severa. Finalmente, algumas lesões podem servir de porta de entrada para infecções, o que pode agravar ainda mais a situação do portador de DM. O resultado é que a interação da doença vascular, da infecção (facilitada pela imunodeficiência e suprimento sanguíneo insuficiente) e da neuropatia periférica transforma o pé diabético em um órgão-alvo de altíssimo risco, originando lesões ulceradas com risco de amputação em 15 por cento dos indivíduos diabéticos (VIRGINI-MAGALHÃES; BOUSKELA, 2008). Como medida de prevenção do pé diabético, além das atividades educativas para o autocuidado, o Consenso Internacional sobre Pé diabético (2001) preconiza o rastreamento do pé em risco com o diapasão de 128 Hz que avalia a sensibilidade vibratória, o monofilamento 5.07 (10g) de Simmes-Weinstein e o chumaço de algodão a sensibilidade tátil, o martelo de Dejerine e martelo neurológico para exame dos reflexos de aquileu e patelar, tubos de ensaio com substâncias frias e mornas para sensibilidade térmica e objetos pontiagudos para testar a sensibilidade dolorosa. Após essa busca de sinais de neuropatia, é feita uma avaliação da perfusão sanguínea com provas de enchimento e esvaziamento capilar para identificar vasculopatia. É recomendado conferir o tipo de calçado, higiene e corte de unhas, situação de hidratação da pele e, por fim, é estabelecido o grau de risco, utilizando a classificação indicada pelo referido Consenso.
Estudos referenciados pela Federação Nacional de Diabetes apontam que cerca de 50 a 70% das amputações dos membros inferiores de pessoas diabéticas poderiam ser evitadas se os mesmos fossem orientados sobre medidas de cuidados preventivos para complicações e praticassem estes cuidados (GRUPO DE TRABALHO INTERNACIONAL SOBRE PÉ DIABÉTICO, 2001). O quadro 1 (adaptado por Gross e Nehme, 1999) apresenta os parâmetros clínicos a serem considerados na avaliação do pé em risco.

A detecção de diminuição de sensibilidade ao monofilamento ou de insuficiência circulatória periférica, assim como a presença de lesões pré-ulcerativas cutâneas ou estruturais, definem o paciente em risco para úlceras. Esses pacientes devem receber material informativo de educação, avaliação freqüente, receber cuidados por profissional habilitado a cerca do uso de calçados adequados e acesso a um tipo de calçado especial, se houver deformidades (GROSS; NEHME, 1999).

O pé em risco é um importante problema de saúde pública, e, como tal, deve receber atenção especial por parte de todos os segmentos da saúde. Destaca-se a ação da atenção primária, na prevenção primária do diabetes melito e secundária das complicações deste. Não menos importantes, os segmentos secundário e terciário devem ser sempre acionados quando necessário, para que assim, o usuário receba atenção a saúde de excelência e mantenha a sua qualidade de vida, diminuindo custos hospitalares e taxas de amputação. Referências BRASILEIRO, J. L. et al. Pé diabético: aspectos clínicos. J Vasc Bras. 4 (1): 11-21, 2005. GROSS, J. L.; NEHME, M. Detecção e tratamento das complicações crônicas do diabetes melito: Consenso da Sociedade Brasileira de Diabetes e Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Rev Ass Méd Brasil. 45 (3): 279-284, 1999.
GRUPO DE TRABALHO INTERNACIONAL SOBRE PÉ DIABÉTICO. Consenso Internacional sobre Pé Diabético. Brasília: Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, 2001. LOPES, C. F. Assistência ao paciente com pé diabético. J Vasc Bras, 2 (1): 79-82, 2003. VIRGINI-MAGALHÃES, C. E.; BOUSKELA, E. Pé diabético e doença vascular: Entre o conhecimento acadêmico e a realidade clínica. Arq Bras Endocrinol Metab 52 (7), 1073-1075, 2008. Crédito da Imagem: http://www.medicineworld.org/

5 de agosto de 2010

Experiência de Estágio no Serviço de Cardiologia da Escola Paulista de Medicina

Por Jailson de Sousa Oliveira
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
O ensino do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), instituição da qual faço parte como aluno desde 2007, vem buscando formar profissionais que atendam as necessidades de saúde do país. A busca de inserção dos estudantes em cenários de prática clínica torna-se limitada, entretanto, devido ao fato de haver poucos serviços de referência no Estado que se disponibilizem a receber estudantes em estágios extracurriculares, conforme preconiza a Lei nº 11.788/08, chamada "Lei do Estágio", que mantém a característica do estágio como atividade sem vínculo empregatício e a necessidade do auxílio dos agentes de integração. A realização de estágios extracurriculares, a meu ver, faz-se necessária para a aquisição de experiência no tocante ao cotidiano de um médico. É nos estágios que o estudante de medicina tem a possibilidade de aprender “fazendo”, sob a orientação de profissionais do próprio serviço. Em relação a isso, o Professor Sérgio Rego (REGO, 1998) salienta que a valorização da prática em estágios constitui-se um componente essencial da transformação do estudante em médico. É a busca pela aquisição dessa experiência uma das principais forças que mobilizam os alunos em seu período de formação - eles valorizam a experiência clínica e procuram adquiri-la sempre que possível. O estágio que acabei de realizar no Serviço de Cardiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) foi muito enriquecedor, tanto no tocante à aquisição de experiência na prática em Cardiologia, quanto em relação à possibilidade de vivenciar como funciona o internato em Medicina na Escola Paulista, uma vez que nesse mês em que estive lá, acompanhei junto com os internos do quinto ano médico o rodízio em Cardiologia. O estágio era realizado no Hospital São Paulo, um hospital universitário que tinha uma estrutura muito boa, tanto fisicamente como em relação ao andamento do serviço. O andar da Cardiologia era composto pela enfermaria de Cardiologia Clínica, que totalizava 25 leitos, pela UTI Cardiológica, que possuía dez leitos, e pela UTI de Cirurgia Cardíaca, que também tinha dez leitos.
A infraestrutura em era muito boa, no entanto senti falta de uma sala de prontuários, uma vez que estes eram guardados em um móvel específico e não existia um ambiente onde pudessem ser discutidos os casos dos pacientes. De início ocorreu uma apresentação do estágio por um dos professores da Disciplina de Cardiologia, que ressaltou que este seria eminentemente prático, mas que seriam realizados seminários pelos alunos e ministradas algumas aulas teórico-práticas sobre eletrocardiografia e arritmias cardíacas. O mesmo citou ainda que seríamos responsáveis pelas evoluções diárias dos pacientes e posterior discussão com os residentes de Clínica Médica e de Cardiologia. O estágio funcionou da seguinte maneira: todos os dias pela manhã fazíamos as evoluções e discutíamos com os residentes os casos. Às 9h30, o professor chegava e eram escolhidos dois casos para serem discutidos com ele. As discussões eram realizadas à beira do leito dos pacientes, sendo estas baseadas na apresentação do caso por algum interno. O professor responsável realizava novamente o exame clínico, discutia as hipóteses diagnósticas, ressaltava os aspectos imprescindíveis a abordagem do paciente cardiológico, assim como discutia as condutas tomadas até então para aquele paciente. O andamento das discussões dependia do professor, alguns discutiam mais o caso em si e as condutas, ao passo que outros preferiam discutir a doença de um modo mais geral. Aprendi muito nessas discussões, principalmente em relação às condutas colocadas para cada paciente, uma vez que realizava o exame clínico destes e podia discutir dúvidas e condutas com os residentes e com o professor. Em um dia da semana, na terça-feira pela manhã tinha a reunião da Cardiologia. Nesta se reuniam professores, residentes de clínica médica e de cardiologia, médicos do serviço e internos para discussão de dois casos escolhidos pelos residentes e apresentação por alguns dos profissionais sobre o que tem de mais novo na área de Cardiologia. Essa reunião era muito interessante, desde os casos que eram levados à discussão até os assuntos apresentados pelos cardiologistas.
Dentre os assuntos discutidos durante o estágio destacaram-se os seguintes: novas diretrizes de hipertensão arterial, novas medicações para tratamento de fibrilação atrial, tratamento do paciente com insuficiência cardíaca e novas medicações no tratamento das síndromes coronarianas agudas. Em uma dessas reuniões foi mencionado por um pós-graduando que a Escola Paulista de Medicina está incluída em 11 estudos multicêntricos em Cardiologia, alguns deles liderados pela Universidade de Duke, dos Estados Unidos. Pude perceber que lá se tem uma maior oportunidade de crescimento em relação à participação em pesquisas de grande porte. Além disso, ocorre uma valorização muito grande por parte dos alunos, uma prova disso é que a maioria deles são alunos do Programa de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC). Outro aspecto que me chamou atenção no estágio foi a realização das práticas de arritmias em um laboratório específico. Nesse laboratório, havia bonecos (manequins) e monitores acoplados a eles. O professor explicava então o ritmo que aparecia no monitor, assim como ensinava a conduta a ser tomada diante de cada ritmo referido. A prática de reanimação cardiopulmonar também foi realizada nesse laboratório de simulação. No turno da tarde acompanhávamos os ambulatórios de Válvulas, Arritmias e Coronariopatia. Dividíamo-nos em grupos de três e realizávamos o atendimento. Quando da chegada do professor, discutíamos todos os casos, que totalizavam cinco ou seis casos por turno. Além disso, no fim da tarde, voltávamos para a UTI cardiológica e discutíamos pelo menos um caso de paciente que se internou na UTI recentemente. Pude ver muitos casos e conhecer o cotidiano do atendimento em Cardiologia. Em dois dias da semana íamos para o serviço de Hemodinâmica, onde acompanhávamos os casos de pacientes que eram encaminhados para a realização de Cateterismo Cardíaco. Essa discussão ocorria junto com os residentes (R5) de Hemodinâmica, o que foi uma experiência muito interessante para conhecimento mais aprofundado dessa subespecialidade da Cardiologia. A realização desse estágio na Cardiologia da UNIFESP foi, sem dúvida, uma vivência riquíssima, tanto do ponto de vista de aprendizado clínico, como na questão de crescimento pessoal, pelo desenvolvimento da habilidade em lidar com os pacientes com doença cardíaca, pelo contato com grandes cardiologistas e com o que tem de mais novo sendo estudado em Cardiologia. Considero que a realização de estágios extracurriculares deve sim ser realizada e estimulada pelas Faculdades de Medicina, uma vez que permite ao aluno ter contato com serviços de referência e com o cotidiano médico. Referência REGO, S. Currículo paralelo em Medicina, experiência clínica e PBL: uma luz no fim do túnel?. Interface (Botucatu), v. 2, n. 3, p. 35-48, 1998 . Foto da postagem: Arquivo pessoal de Jailson de Sousa Oliveira [Ligiana Leite, Jailson de Sousa e Mabel Soares].

Espiritualidade e Saúde

Por Charles Saraiva Gadelha
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

A influência da espiritualidade na saúde das pessoas vem sendo muito estudada e documentada. Tem sido demontrada uma íntima relação desta com o bem-estar psicossocial e físico. Aspectos da espiritualidade devem ser levados em conta na construção da relação médico-paciente e no próprio processo de manejo terapêutico, oferecendo, assim, uma abordagem holística ao paciente.

Palavras-chave: Espiritualidade. Religião. Qualidade de vida. Nas últimas décadas, a medicina vem enfocando cada vez mais um modelo de atendimento mais abrangente na área da saúde. Os pacientes querem ser tratados como pessoas, e não como doenças, e devem ser observados como um todo, incluindo-se as suas dimensões física, emocional, social e espiritual, sem separação. Desde a Assembléia Mundial de Saúde, em 1983, a inclusão de uma dimensão “não material” ou “espiritual” de saúde vem sendo discutida extensamente, a ponto de haver uma proposta para modificar o conceito clássico de saúde da Organização Mundial de Saúde para “um estado dinâmico de completo bem-estar físico, mental, espiritual e social e não meramente a ausência de doença” (WHO, 1998). Dessa forma, a atenção ao aspecto da espiritualidade torna-se cada vez mais necessária na prática de assistência à saúde. Cada vez mais a ciência se curva diante da grandeza e da importância da espiritualidade na dimensão do ser humano. Para Jung (1986), a espiritualidade não está obrigatoriamente associada à fé religiosa, mas sim à relação transcendental da alma com a divindade e na mudança que daí advém. A espiritualidade estaria, assim, relacionada com uma atitude, uma ação interna, uma ampliação da consciência, um contacto do indivíduo com sentimentos e pensamentos superiores e no fortalecimento e amadurecimento que esse contacto poderá trazer para a sua personalidade. Definições mais recentes do conceito de espiritualidade focam-se na multidimensionalidade da experiência humana e incluem dimensões, tais como busca pessoal pelo significado e propósito da vida, ligação a uma dimensão transcendental da existência, as experiências e sentimentos associados a essa busca e ligação (amor, esperança, paz interior) (SAAD et al., 2001). Vemos assim que, apesar de existirem algumas variações no que diz respeito à definição deste conceito, todas elas têm em comum o fato de salientarem a importância que a espiritualidade tem ao providenciar um contexto em que as pessoas possam dar sentido às suas vidas, terem fé, sentirem-se completas e em paz consigo mesmas e com os outros (MILLER; THORESEN, 2003). É nesse sentido que parte da comunidade médica tem lutado pela introdução das questões de ordem espiritual na relação médico-paciente. Além destes aspectos, em um estudo prospectivo, Lutgendorf et al. (2004) avaliaram a relação entre frequência de prática religiosa, níveis séricos de interleucina-6 e mortalidade em 557 adultos idosos. A prática de atividades religiosas, pelo menos, uma vez por semana, foi significativo preditor de menor mortalidade em 12 anos de seguimento e da menor elevação de marcadores inflamatórios. Ironson et al. (2006) avaliaram os efeitos de mudanças na religiosidade e na espiritualidade após o diagnóstico de soropositividade para o HIV e suas consequências sobre as dosagens de CD4 e carga viral. Utilizando um modelo de regressão linear, avaliou-se a associação de efeitos entre a prática religiosa, CD-4 e carga viral. Independentemente do tipo de prática religiosa, quadro inicial da doença, medicações em uso, idade, sexo, etnia, educação, hábitos de vida, depressão e suporte social, a mudança na prática de atividades religiosas foi fator preditor independente para redução da carga viral e aumento dos valores de CD4. Hummer et al. (1999) avaliaram dados do National Health Interview Survey (NHIS) em 21.204 casos e, entre estes, 2.216 óbitos, associando a frequência de prática religiosa a aspectos sociodemográficos, de saúde e comportamento. Verificaram que pessoas que nunca tiveram ou que exerceram prática religiosa irregular apresentavam risco de óbito 1,87 vez maior quando comparadas àquelas com prática religiosa de pelo menos uma vez por semana. Tal associação se traduziu em diferença de cerca de até sete anos adicionais, na expectativa de vida, entre os grupos. Outras evidências sugerem que a prática religiosa semanal pode ser fator protetor contra doenças cardiovasculares, por promover melhor controle de ansiedade/estresse e hábitos saudáveis de vida (POWELL et al., 2003). Há também riscos a serem considerados nessa área. Pensamentos negativos gerando sentimentos de culpa oriundos de determinada crença religiosa podem ocasionar mais sofrimento ao paciente, levando à sensação de abandono, desamparo e baixa auto-estima. Determinadas orientações religiosas podem fazer o indivíduo abandonar o tratamento médico tradicional, havendo piora imediata do seu quadro clínico, embora a maioria das religiões não estimule a interrupção do tratamento médico (KOENIG et al., 1991) Entretanto, a influência da religiosidade/espiritualidade tem demonstrado potencial impacto positivo sobre a saúde física, definindo-se como possível fator de prevenção ao desenvolvimento de doenças, na população previamente sadia, e eventual redução de óbito ou impacto de diversas doenças. É por tudo isto que se acredita que todos os recursos disponíveis, inclusive os de ordem espiritual, que encorajem a cura, o ajustamento psicológico e uma melhor qualidade de vida dos doentes, devem ser seriamente considerados. Referências HUMMER R. A. et al Religious involvement and U.S. adult mortality. Demography 36 (2): 273-285, 1999. IRONSON, G.; STUETZIE, R.; FLETCHER, M. A. An increase in religiousness/spirituality occurs after HIV diagnosis and predicts slower disease progression over 4 years in people with HIV. Journal of General Internal Medicine 21: S62-68, 2006. JUNG, C. A natureza da psique. Petrópolis: Vozes, 1986. KOENIG, H. G. et al. Religious perspectives of doctors, nurses, patients, and families. J Pastoral Care 45: 254-267, 1991. LUTGENDORF, S. K. et al. Religious participation, interleukin-6, and mortality in older adults. Health Psychology 23 (25): 465-475, 2004. MILLER, W.; THORESEN, C. Spirituality, religion and health: An emerging research field. American Psychologist, 58 (1): 24-35, 2003. POWELL, L. H.; SHAHABI, L.; THORESEN, C. E. Religion and spirituality. Linkages to Physical Health. American Psychologist 58 (1): 36-52, 2003. SAAD, M.; MASIERO, D.; BATTISTELLA, L. Espiritualidade baseada em evidências. Acta Fisiátrica 8 (3): 107-112, 2001. WORLD HEALTH ORAGANIZATION. WHOQOL and spirituality, religiousness and personal beliefs (SRPB): Report on WHO Consultation. Geneva: WHO, 1998.
Crédito da Imagem: http://www.medicina.ufmg.br

3 de agosto de 2010

Lesões orais cancerizáveis

Por Bruno Melo Fernandes
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

As lesões orais de potencial maligno são estágios iniciais do câncer de boca. Em geral, estão relacionadas ao tabagismo, sendo as mais prevalentes a leucoplasia, a eritroplasia e a queilite actínica. São condições geralmente assintomáticas e, por isso, o diagnóstico é muitas vezes retardado, permitindo que a lesão evolua para transformação maligna. O rastreio da população, especialmente dos grupos de risco, é essencial para uma terapia precoce e de bom potencial curativo.

Palavras-chave: Leucoplasia, Medicina Bucal, Queilite. Lesões pré-malignas, ou cancerizáveis, segundo Neville (2004), são alterações teciduais que possuem potencial para assumir um caráter de neoplasia maligna, sendo, portanto, precursoras de malignidades. Esta transformação pode ocorrer a qualquer tempo e em velocidades variáveis, mas é uma característica importante das lesões pré-malignas a possibilidade destas também se manterem estáveis por um considerável período de tempo. O diagnóstico neste estágio é essencial para a terapia precoce, que exibe elevada possibilidade de cura. O sistema tegumentar compreende uma grande variedade de lesões, as quais permitem uma abordagem clínica bastante ampla no tocante à detecção de alterações precursoras de malignidades. Em relação às lesões orais mais especificamente, a detecção de lesões pré-malignas é especialmente útil ao clínico, visto ser bastante característica das neoplasias orais a passagem por um estágio inicial de evolução de caráter pré-maligno. De maneira geral, os principais fatores de risco para lesões orais, especialmente para aquelas de potencial maligno, são alcoolismo, infecções orais e dentárias de repetição, exposição à radiação solar, imunodepressão, próteses mal ajustadas e, especialmente, o tabagismo em todas as suas formas. Alguns estudos mostram que cerca de 80% de todas as lesões orais cancerizáveis incidem em indivíduos tabagistas. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2005, modificou a terminologia das lesões e condições orais pré-malignas e as denominou lesões com potencial de malignização (VAN DER WAAL, 2009). Segundo essa classificação, são lesões orais potencialmente malignas a leucoplasia, a leucoplasia verrucosa proliferativa, a eritroplasia, a queilite actínica, a fibrose submucosa, o líquen plano e a atrofia por deficiência de ferro. Segundo estudo de Silveira et al. (2009), a leucoplasia é a mais prevalente dentre as lesões orais de potencial maligno (70,7%), seguida da queilite actínica (16,1%) e da eritroplasia (9,8%). Ainda segundo este estudo, o pico de incidência ocorre em indivíduos entre 50 e 65 anos, sendo a eritroplasia e a leucoplasia mais comuns no sexo feminino e a queilite actínica mais prevalente no sexo masculino. Leucoplasia é um termo clínico genérico utilizado para denominar uma placa predominantemente branca da mucosa oral, não removível à raspagem, que não pode ser classificada clinicamente em qualquer outra entidade. Sua superfície pode apresentar-se lisa, rugosa ou verrucosa, sendo a lesão precursora de câncer mais frequente da boca. Acomete principalmente a mucosa jugal e as comissuras labiais, e possui uma taxa de transformação maligna variando de 0% a 20%, sendo em média de 5% (SCHEPMAN, 1998). A queilite actínica é um quadro de natureza inflamatória com notável potencial de malignização, e que acomete exclusivamente o lábio inferior. São lesões causadas pela exposição crônica e prolongada aos raios solares (mais comuns em indivíduos brancos), sendo, em geral, alterações assintomáticas que podem ser brancas, vermelhas, brancas com áreas vermelhas, ou ainda, ulceradas. De maneira geral a queilite se apresenta com um aspecto atrófico, pálido e frequentemente com fissuração. Relata-se que a taxa de transformação maligna dessa lesão varia de 10% a 20% (MARKOPOULOS eal., 2004). A eritroplasia, semelhante à leucoplasia, é definida como uma placa ou mancha vermelha que não pode ser classificada clinicamente como qualquer outra entidade. Pode associar-se a uma leucoplasia adjacente, sendo denominada, nesse caso, eritroleucoplasia. Apesar de ser menos comum que a leucoplasia, a eritroplasia apresenta maior potencial para transformação maligna (14% a 50%), pois em cerca de 90% dos casos consiste em uma displasia moderada ou severa (VAN DER WAAL, 2009). As demais lesões orais de potencial maligno são menos prevalentes e, diferentemente das lesões mais comuns supracitadas, costumam fazer parte de condições sistêmicas, como é o caso do líquen plano e da atrofia por deficiência de ferro. Nesse sentido, seu diagnóstico é mais fácil, já que há uma maior magnitude no quadro sistêmico, o qual chama mais atenção no tocante ao diagnóstico. Em contraste, as lesões mais prevalentes (leucoplasia, eritroplasia e queilite actínica) são condições assintomáticas ou oligossintomáticas, sem repercussões sistêmicas associadas. Dessa forma, costumam passar despercebidas por muito tempo, sendo menosprezadas pelos pacientes e pelos próprios médicos. A demora no diagnóstico possibilita a transformação maligna e a ocorrência do câncer de boca, piorando muito o prognóstico do paciente. O tratamento dessas lesões, em geral, resume-se ao acompanhamento de lesões ou na ressecção, especialmente por laser, crioterapia ou cirurgia. Assim, o aspecto mais importante no estudo das lesões orais cancerizáveis é o entendimento da necessidade de rastrear seu aparecimento, especialmente nos grupos de risco, para realização de um diagnóstico precoce e de uma terapia eficaz, a qual, antes da malignização, permite taxas de cura elevadas. As lesões pré-malignas, se tratadas neste estágio, possuem um ótimo prognóstico, com baixas taxas de recidiva. Referências MARKOPOULOS, A.; ALBANIDOU-FARMAKI, E.; KAYAVIS, I. Actinic cheilitis: clinical and pathologic characteristics in 65 cases. Oral Dis, v.10, p.212-6, 2004. NEVILLE, B. W. et al. Patologia Oral & Maxilofacial. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
HEPMAN, K.P. et al. Malignant transformation of oral leukoplakia: a follow-up study of a hospital-based population of 166 patients with oral leukoplakia from The Netherlands. Oral Oncol, v.34, n.4, p.270-5, 1998. SILVEIRA, E. J. D. et al. Lesões orais com potencial de malignização: análise clínica e morfológica de 205 casos. J. Bras. Patol. Med. Lab., v. 45, n. 3, 2009. VAN DER WAAL, I. Potentially malignant disorders of the oral and oropharyngeal mucosa; terminology, classification and present concepts of management. Oral Oncol, v. 45, n. 4-5, p. 317-23, 2009.
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