26 de fevereiro de 2011

Síndrome Neuroléptica Maligna

Por Rosa-Maria Silva Soares Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
Resumo

A síndrome neuroléptica maligna é um evento adverso grave relacionado ao uso de neurolépticos, antidepressivos e outras drogas antipsicóticas, provavelmente relacionada ao bloqueio dos receptores dopaminérgicos nos gânglios da base. Caracteriza-se, principalmente, por hipertermia, alteração do nível de consciência, hipertonia, disfunção autonômica e insuficiência respiratória. Os principais agentes implicados na gênese desta síndrome são o haloperidol e a clorpromazina.

Palavras-chave: Reações Adversas a Medicamentos. Síndrome Maligna Neuroléptica. Agentes Antipsicóticos. A síndrome neuroléptica maligna (SNM), também conhecida como síndrome da deficiência aguda de dopamina, é um evento adverso grave relacionado ao uso neurolépticos, antidepressivos e outras drogas antipsicóticas, provavelmente relacionado ao bloqueio excessivo dos receptores dopaminérgicos nos gânglios da base. Alguns estudos sugerem que fatores genéticos, como defeitos no gene do receptor da dopamina D2, possam estar envolvidos (LISTE et al., 2008). A SNM acomete 0,5 a 1% dos pacientes expostos ao uso de neurolépticos, e o pico de incidência ocorre aos 40 anos, predominando no sexo masculino, na proporção de 2:15. Oitenta por cento dos casos ocorrem no início tratamento (HANEL et al., 1998; KHALDI et al., 2008). Entretanto, alguns casos podem surgir mesmo após longo tempo de uso de um agente neuroléptico. Os principais agentes implicados na gênese desta síndrome são o haloperidol e a clorpromazina. Porém, diversas outras drogas têm sido citadas como causadoras da SNM, entre elas flufenazina, lítio, tioridazina, clozapina, metoclopramida, tetrabenazina, ecstasy e carbamazepina (HANEL et al., 1998). Condições clínicas associadas, como doença de Parkinson em pacientes sem exposição prévia a neurolépticos e infarto agudo do miocárdio, também são descritas. A SNM caracteriza-se por hiperpirexia, alteração do nível de consciência, hipertonia, disfunção autonômica e insuficiência respiratória, podendo ainda ser encontrados rabdomiólise e leucocitose. Porém, o quadro clínico mais típico é de alteração do estado mental e rigidez muscular, precedendo ou acompanhado de febre. A fisiopatologia da SNM não é claramente compreendida. Tem sido sugerido que o potencial para induzir este quadro pelos neurolépticos é paralela à potência do bloqueio da dopamina no trato nigroestriatal, mesocortical e núcleos do hipotálamo. No entanto, é intrigante que a síndrome possa aparecer com o uso de antipsicóticos atípicos, especialmente a clozapina, que é caracterizado principalmente pela sua baixa afinidade para receptores dopaminérgicos D1 e D2 (KHALDI et al., 2008). Os principais fatores de risco associados são episódio anterior de SNM, início de tratamento, rápido aumento das doses, associação com lítio, presença de síndrome mental orgânica (demência, alcoolismo), indivíduos desnutridos e desidratados, exaustão física, esquemas de polifarmácia, neuroléptico de alta potência (mesmo em doses baixas), neuroléptico de ação prolongada, entre outros (GUERRA, 2002). Múltiplos mecanismos, incluindo a resposta de fase aguda, a hipertermia induzida por estresse, o efeito de drogas, etc, envolvendo interações composição, são necessários a fim de precipitar a hipertermia (GILLMAN, 2010). A SNM é um quadro raro, mas potencialmente fatal. Foi descrita em 1960 por Delay et al., apud KHALDI et al., 2008] como a "síndrome hypertonique akinétique" (síndrome acinético hipertônica) com seus sintomas cardinais: hipertermia, sintomas extrapiramidais, alteração do estado mental e disfunção autonômica. O diagnóstico baseia-se em critérios clínicos e laboratoriais, além da exclusão de outras possíveis causas de quadros semelhantes. Segundo a Associação Americana de Psiquiatria, no DSM-IV, são necessários rigidez muscular severa e febre acompanhados de, no mínimo, dois dos dez itens seguintes: diaforese, disfagia, tremor, incontinência, alteração do estado mental, mutismo, taquicardia, pressão arterial elevada ou lábil, leucocitose, creatinofosfoquinase elevada (HANEL et al., 1998). Segundo Flaherty et al., citados por Guerra (2002), ainda podem ocorrer outros sintomas adicionais, como anormalidades motoras (tremores, discinesia, acinesia, crise oculógira, opistótonos e coréia), sialorréia, complicações respiratórias e convulsões tônico-clônicas generalizadas. A presunção implicitamente aceite que SMN é uma síndrome hipermetabólico e hipertérmico é questionável e não explica a morbidade extensa na maioria dos casos, onde a temperatura é inferior a 39°C (GILLMAN, 2010). No diagnóstico diferencial da SNM várias situações clínicas devem ser consideradas. Pneumonia seguida de reação distônica generalizada é, sem dúvida, o principal diagnóstico diferencial da SNM (HANEL et al., 2008). Síndrome de abstinência como delirium tremens, hipertermia maligna, catatonia letal aguda, interações medicamentosas e infecções causando sintomas extrapiramidais também devem ser excluídas. A SNM está associada a uma série de complicações, com mais de um terço dos pacientes necessitando de cuidados em unidade de terapia intensiva. A maior causa de morbidade e mortalidade é a insuficiência respiratória (Ibid), que pode ser ocasionada por broncoaspiração, embolia pulmonar e choque. Outras complicações são insuficiência renal secundária à rabdomiólise e mioglobinúria, convulsões, coagulação intravascular disseminada, sepse e infarto agudo do miocárdio (MARCHIORI: CARVALHO, 2005). O prognóstico da SNM depende fundamentalmente da precocidade do diagnóstico e do tratamento instituído. Setenta e nove por cento dos pacientes com SNM podem ter recuperação completa e 8% tem recuperação não completa (Ibid).
A mortalidade da síndrome varia de 9 a 30% (HANEL et al., 1998), estando relacionada com os casos mais graves, que evoluíram muito tempo sem diagnóstico e sem tratamento adequado. Já os quadros diagnosticados rapidamente, nos quais a medicação neuroléptica foi suspensa imediatamente, têm um prognóstico bastante favorável com o tratamento específico.
Referências GILLMAN, P. K. Neuroleptic malignant syndrome: mechanisms, interactions, and causality. Mov Disord. 25 (12): 1780-90, 2010. GUERRA, D.S.L. Síndrome Neuroléptico Maligna: Impregnação Maligna? Jornal Mineiro de Psiquiatria, 19 (2), 2002. Disponível em: http://www.jmpsiquiatria.com.br/edicao_19/artigos_edicao_19/02_sindrome.htm HANEL, R. A.; SANDMANN, M. C.; KRANICH, M; BITTENCOURT, P. R. M. Síndrome neuroléptica maligna: relado de caso com recorrência associada ao uso de olanzapina. Arq. NeuroPsiquiatria. 56 (4): 833-837, 1998. KHALDI, S. et al. Neuroleptic malignant syndrome and atypical antipsychotics: a brief review. Encephale. 34(6): 618-24, 2008. LISTE, J.Y.V.; AVILA, H.M.; HERNANDEZ, S.I.T.; CHAVIANO, D.M. Síndrome neuroléptico maligno. Rev Cubana de Medicina Intensiva y Emergencias, 7 (2): 1033-1039, 2008. MARCHIORI, P.E.; CARVALHO, N.B. Síndrome Neuroléptica Maligna. Rev Neurociências, 13(3): 47-48, 2005. SILVA, H.C.A.; BAHIA, V.S.; OLIVEIRA, R. A. A.; MARCHIORI, P.E.; SCAFF,M.; TSANACLIS, A. M. C. Susceptibilidade à hipertermia maligna em três Pacientes com síndrome maligna por neurolépticos. Arq Neuropsiquiatria 58 (3-A): 713-719, 2000.
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